Ana tinha
sempre um sorriso nos lábios. Muita gente perguntava-lhe porque estava sempre a sorrir e ela contava
sempre a mesma história, que vos passo a descrever.
Desde
pequenina que ia para a mercearia da avó, uma daquelas mercearias a sério em
que o café é a avulso, as encomendas embrulhadas em papel manteiga e as medidas
pesadas numa balança de pesos. Tudo feito à mão com muito carinho e sem
pressas.
Era, aliás, da
balança que ela mais gostava. Primeiro, quando mal se aguentava em pé e até lhe
nascerem os segundos dentes, entretivera-se a ver os pratos balouçar, poisando
o que aparecia no balcão ora num, ora noutro prato da balança.
Quando entrou
na escola, a balança começou a ensina-la a aprender os números, a contá-los e a
chamá-los pelos nomes.
Com o tempo foi
aprendendo a pesar.
Descobriu
rapidamente que preferia um quilo de cerejas a um quilo de laranjas, embora um
quilo de laranjas, quando na época, desse bastante sumo. Assim como percebeu
que 4 pêssegos grandes pesavam cerca meio kilo e que isso não chegava a um
quarto do peso de um ananás.
As pessoas
achavam graça à sua forma de pesar os produtos e ela ia desenvolvendo uma
mestria na pesagem que poucos igualavam.
A balança
ensinou-lhe mais do que matemática.
Aos poucos e
com o seu próprio conhecimento do mundo, foi desenvolvendo aquilo a que chamou “pesagem
abstrata” e que consistia em pesar situações chave da sua vida, tal como pesava
as frutas da mercearia da avó quando era pequena.
Pesava com
precisão tudo aquilo com que se questionava:
Adiantaria
dormir mais horas e não ver aquele filme que tanto gostava ou seria melhor ir
trabalhar com olheiras no dia mas inspirada no seu filme favorito? Não se
sentiria mais feliz?
Não seria
melhor calçar sapatos rasos, menos elegantes, mas poder brincar no parque com o
seu sobrinho à vontade? Não valeria o sorriso dele mais do que a elegância de
uns saltos altos?
E aquele rapaz
que tinha conhecido? Era simpático… mas
era prazeroso o suficiente na sua vida para ficar triste? Talvez não valesse
tanto a pena.
Ana
respondia a todas as questões metendo-as à prova na sua balança.
Era
por isso uma pessoa feliz, por ter uma boa balança interior, das que pesavam com
carinho, sem pressas.